Scene in the office between the boss and timid worker

Meditação (um pouco mais) aprofundada sobre Anúncios de Emprego

Recentemente, elaborei (aqui) uma breve reflexão sobre anúncios de emprego. O exercício foi breve, porém, curiosamente, nos últimos dias (por coincidência, ou então apenas porque os algoritmos do google perceberam que eu dou particular atenção ao tópico) comecei a ser confrontada com autênticas preciosidades em Anúncios de Emprego.

Inúmeros portugueses são expostos, diariamente, a estas pérolas poéticas e, contudo, a Academia está a desprezar esta magnífica área na literatura nacional. Fazem falta estudos académicos e sérios sobre o tema. Muito se fala sobre ‘Recursos Humanos’, mas nada se diz sobre os Anúncios que os ditos Recursos escrevem para os Humanos. Não contem comigo para vos falar disto com muita ‘seriedade’. Mas sinto que estou prestes a ser pioneira da Academia, pois hoje, em vez de me debruçar apenas numa breve reflexão, opto por apresentar uma meditação já um pouco mais aprofundada (vou esclarecer quem me lê: o meu pioneirismo começa na aplicação de uma espécie de ‘Escala de Níveis da Contemplação’ – que acabei de inventar – o grau de Reflexão está ali no limiar da iniciação ao comentário, enquanto o grau de Meditação já elabora um comentário mais detalhado).

Quando os ‘Recursos Humanos’ tratam ‘humanos’ como simples ‘recursos’, algo está errado.

Isso podia fazer sentido em 1998. Mas, entretanto, já passaram mais de 20 anos. Dave Ulrich afirmava (em 1998) que “existem boas razões para a fraca reputação desta área, pois normalmente são pouco eficazes”, porém a verdade é que aplicando a tal meditação – um pouco mais aprofundada – aos incontáveis anúncios de emprego que, diariamente, são publicados na imprensa ou propagados na internet, percebemos que a maioria das organizações ainda está longe de entender os ditos ‘humanos’. E a verdade é que são estes ainda – acima de todos os demais – os mais preciosos ‘recursos’ para assegurar a continuidade e sustentabilidade dos negócios.

Vejamos o primeiro exemplo.

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Sem poder aqui esmiuçar toda a profundidade linguística, que demonstra todo o empenho e dedicação que o autor consagrou à elaboração deste anúncio, vou apenas focar-me no recurso estilístico que levou o autor a redigir a frase “Só serão aceites candidaturas de candidatos que tenham toda a situação regularizada, que permita o exercício de actividade profissional.”

Vamos lá assumir o pleonasmo com a frontalidade que é necessária: todos nós sabemos que, quem opta por elaborar a sua Candidatura a um anúncio de emprego, nem sempre é um Candidato [aquele momento em que sinto necessidade de uma pausa para meditação…]. Ora bem, após meditação concluo que, por vezes, são simples sujeitos, (ou meros indivíduos, ou quiçá exemplares da espécie humana – também conhecidos como ‘recursos humanos’) que, perdidos no ócio da vida, se cruzam com estas mensagens, que anunciam empregos, e então pensam “Olha que pedaço literário tão encantador. Está aqui um texto que sim senhora! Não resisto a enviar toda a minha informação pessoal e profissional para o autor desta pérola.

Mas, para o autor do anúncio, estes Candidatos devem ainda possuir “toda situação regularizada”. Fico com tantas dúvidas sobre a expressão ‘toda situação’. Se for em contexto filosófico sabemos que uma ‘situação’ (de acordo com o Dicionário de Lingua Portuguesa, da Porto Editora) refere-se a um “complexo que resulta da interação, em dado momento, de um ser vivo, e sobretudo  de uma pessoa, com o seu meio social, físico ou mesmo intelectual”. Ora, ter isto tudo regularizado? E como comprovar isto tudo no CV? Não faço ideia. Mas provavelmente quem redigiu o anúncio também não. Portanto fiquemos por aqui.

Vamos a outro exemplo.

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[…novo momento de pausa para um longo suspiro prolongado…..]

De acordo com a Lei 9.029/95, atos de discriminação no processo seletivo, por raça, sexo, origem, estado civil situação, familiar ou idade, podem gerar punição por parte do Ministério Público contra a empresa. Portanto fico com muitas dúvidas sobre a exigência do “curriculo c/ foto”. E valerá sequer a pena comentar o resto? Considero que não… #ai #cansaço!

Arrisco afirmar que a vida de quem procura emprego é, por estes dias, tormentosa. As boas notícias são, felizmente, que temos índices de desemprego muito baixos. A oferta de emprego é maior que a procura e os anúncios são quase ilimitados [eu confesso que gosto bastante disto porque tenho imensa matéria-prima para analisar do ponto de vista do meu pioneirismo académico] mas a escolha, para quem esteja, efectivamente, à procura de emprego e se depare com esta realidade é, por certo, uma escolha dolorosa… #RIP

O meu objetivo é, mais uma vez, apelar aos Senhores(as) Responsáveis pela Redação de Anúncios:
Respeitem os vossos Candidatos.
Sejam criativos e sejam rigorosos.
Se necessário peçam ajuda à malta da comunicação (é gente que, geralmente, percebe alguma coisa desse fenómeno extraordinário que é: comunicar. Com recursos. E também com humanos.)
Cuidem da redação dos vossos Anúncios de Emprego, pois são textos que vão ser lidos e – relembro que sois vós os primeiros interessados – que sejam respondidos!

E, novamente, há exemplos bons. E por isso deixo aqui um: simples, criativo, eficaz. Não é português, mas poderá servir de inspiração ao nosso mercado:

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Referências:
ULRICH, Dave (1998). A new mandate for human resources. Harvard Business Review. Jan/Feb.